terça-feira, fevereiro 05, 2008

CANTARES DO MEU SENTIR poema de José Maria Lopes de Araújo




CANTARES DO MEU SENTIR



Olho os telhados e tento,
Muita vez, adivinhar
Quanta alegria ou tormento
Estão eles a abrigar !


Pensa mal o que pensar
Que a grandeza tudo encerra !
É que o monte, sendo monte,
Nunca deixa de ser terra !


E é bem alto ; todavia ,
Em tempos de paz ou guerra,
Que o possua a fidalguia ;
Monte é terra, sempre terra !


Para que hás-de tu pensar
Que és aquilo que não és ?
Nunca se pode avançar
Sem ter asas ou ter pés ! ...


Vi-te passar presunçosa,
Orgulhosa, no caminho !
Não conheço uma só rosa
Que não traga o seu espinho !


Tal como a flor é a vida ,
Muito breve, passageira ...
Cada pétala caída,
Marca a hora derradeira !


Por que motivo a tristeza
Me domina, sem razão,
Quantos mundos de beleza
Envolvem meu coração ?


Nada é certo, nesta vida,
Onde só existe um norte
Que nos aponta a descida,
Á negra vala da morte !


Quando te vejo chorar,
Solta-se triste, meu canto ,
Tentando, em vão, abafar
As agruras do meu pranto !


Tudo aquilo que se sente,
Cá dentro, no coração,
Não pode entender a gente
Que não sinta o mesmo, não !


Nada já de ti existe,
Amarga e triste verdade ...
Desde a hora em que partiste
Chora connosco a saudade.


Se eu pudesse, num segundo,
Ser o quanto pensas ser ;
Não havia, neste mundo,
Ninguém com tanto poder !


Esfumam-se anos passados ...
Vim nas asas da ilusão.
Trouxe meus olhos molhados ...
Deixei-te meu coração ! ...


É a flor que mais floresce,
Esta flor da gratidão ...
Quanto mais se colhe, cresce
No jardim do coração .

Quando o Sol, hóstia sagrada,
Cai na vala do poente,
Com véu da noite calada ,
De luto se veste a gente .


Ninguém deve censurar
O que não sabe entender ...
Não pode o mudo falar ,
Nem o cego pode ver ! ...


Cantares da minha dor ,
Cantares do meu sofrer ,
São meus cânticos de amor
Que ninguém sabe entender ! ...


Como o tempo corre, passa ,
Bem veloz , quando a alegria ,
De mãos dadas , com a graça ,
Vive em nós , em cada dia !


Ser poeta , sabes lá ,
Como é triste ser poeta ! ...
Ouvir o nosso sentir ...
Viver-se a vida de asceta !


Nunca sintas pena, não ,
De não saberes cantar ...
Quando canta o coração ,
Há vontade de chorar !


E que sabes tu da vida,
Se não chegaste a viver ,
Pequena fase dorida ,
Do seu dorido sofrer ? ...


Tanta mágoa, tanto espinho ,
Tanta lágrima salgada ,
Encontramos no caminho
Desta vida amargurada ! ...


Com a cara de “ bonzinho “
E terço sempre na mão,
Enganas qualquer santinho ,
Mas, o Senhor, é que não ! ...


Como tem sido tão bom,
Para nós, Nosso Senhor,
Que nos vai envelhecendo,
Remoçando o nosso Amor ! ...


José Maria Lopes de Araújo
do Livro " Outono da Vida "

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